FEIJÃO PRETO.
Era
uma prática costumeira dos agricultores de Várzea Alegre-Ceará, epalharem o
feijão novo nas calçadas, para secar um pouco antes ser colocado nos tubos.
Certo
dia chegou Raimundo Beca e seu filho Benedito com um saco de feijão para secar.
Derramaram na calçada e espalharam.
Raimundo
Beca chamou os filhos; Benedito, João e Francisco e recomendou:
Vocês três fiquem pastorando o feijão para os bichos não comer, que eu vou lá
na rua e quando voltar nós ramo intubar. Mais num vão sair daí não.
Raimundo
saiu e os três ficaram de guarda. Com pouco tempo chegou Damião dos Bonecos e
Antônio seu sobrinho e foi logo fazendo o convite errado:
-
Ei negada. Ramo brincar um boi alí no terreiro do véi Matia.
João
respondeu em nome dos três:
-
Dá certo não qui pai deixou nós butando sintido nesse feijão prus bicho num
cumê.
-
Qui bicho? Os bicho qui tem aqui na Vazante é os meu buneco.
-
Mais tem as cabra de Zé Vicente.
-
Mais uma hora dessa elas tão drumendo.
Os
vigilantes ficaram convencidos e abondonaram o posto.
Mas
foi só o que deu. Aquela era exatamente a hora que as cabras passavam para
beberem água na lagoa de São Raimundo.
Sem
contenção os animais fizeram a maior farra, comeram todo o feijão e foram
dormir debaixo de um juazeiro que tinha perto. Da calçada até o juazeiro elas
deixaram um rastro de bolinhas pretas que denunciava a bagunça.
Os
meninos entusiasmados com o jogo de peão, deixaram o tempo passar, lá uma hora,
João que era o mais experiente falou;
-
Bora cambada, que pai já tá perto de voltar. De longe eles observaram que a
calçada estava vazia. Quando João avistou as cabras falou:
-
Foi as cabras de Zé Vicente. Ramo butar elas pra fora e quando pai chegar nós
ramo dizer a ele que foi qui robaro quando nós fumo tumar água.
Quando
Raimundo chegou que notou a cara de preocupados dos
três foi logo perguntando:
-
Cadê o feijão? Bando de fi duma égua?
João
falou pelos três:
-
Eu acho qui robaro. Pai.
-
Robaro Cuma? Eu nun deixei vocês pastorando?
-
Eu acho qui foi na hora qui aquele couro caiu, porque foi preciso nós espichar
ele de novo na parede do oitão, aí o ladrão aproveitou.
-
Pois tá certo. Vocês fique aí qui eu vou tumar um bãe e vorto já pra nóis
cunversar. Depois do banho Raimundo saiu com uma expriguiçadeira, armou na
calçada e puxou a conversa:
-
Quer dizer qui robaro o feijão?
João
respondeu:
-
Foi pai. O ladrão levou o nosso e deixou um bucado de feijão preto pra nós.
-
Pois ramo fazer disso, pegue um cúia e vão catar o feijão preto, depois eu vou
contar. Cada caroço vai ser uma chicotada no lombo de cada um.
Depois
que deu a ordem simulou que estava dormindo e escutou quando João disse para os
irmãos:
-
Nóis ramo fazer assim; Nóis bota um bostinha dessas na cúia e interra três, que
a peia vai ser mais pouca.
Quando
terminaram foram com a cúia até o pai.
Raimundo
que nunca tinha dormido disse:
-
Muito Bem. Eu vou contar os feijão da cúia e como eu já disse cada caroço vai
ser uma chicotada no lombo de cada um, depois eu vou atrás daqueles qui vocês
interraram e cada um qui eu incontrar vai ser três chicotada pra cada.